As grandes corporações descobriram que o mercado é feito de
pessoas com sentimentos e que esses são gatilhos para as decisões de compra.
Daí as agências estão se baseando no neuromarketing – a nova
ciência do comportamento do consumidor para criar publicidade ancorada nas
necessidades emocionais e oferecer produtos embalados de “felicidade”. Os
comerciais com apelo emocional estão por toda parte! No adesivo do carro da
lavanderia do bairro, nos comerciais de perfume, de plano de saúde, de
farmácia, banco, e claro, nos produtos alimentícios!
Somos presas muito fácies para esse tipo de campanha. Porque
o estresse, que é o conjunto de respostas do corpo diante das ameaças da vida
(nem sempre reais, às vezes mais ameaçadoras do que tigres famintos), nos deixa
exaustos e com a sensação de não ter recursos suficientes. O medo deixa o peito
vazio e, ou nos paralisa, ou estimula o excesso de atividade. Qualquer coisa é
melhor do que parar e olhar para o tigre faminto, para a sensação de vazio, de
que o tempo e o dinheiro nunca serão suficientes para todas as demandas, de que
nunca seremos tão belos, tão magros, tão cultos, tão legais, tão eficientes,
tão saudáveis. Ficamos paralisados com a sensação de que nunca chegaremos lá ou
nos engajamos numa corrida desenfreada para chegar lá a qualquer custo,
inclusive o da exaustão e solidão, ou até da perda da saúde.
Como preencher o peito vazio e apertado? Consumindo (comendo,
comprando). Funciona? Sim. Temporariamente. Comer seu prato preferido, beber um
vinho caro em uma taça de cristal, ficar linda num modelito novo, sair do
cabelereiro com aquela cara de comercial de shampoo, assistir a um filme
alegre, viajar em um carro confortável, treinar Yoga em um tapetinho que não
escorrega, tudo isso traz prazer imediato e faz o coração vibrar. Isso é
felicidade? Não. Isso é prazer. Tá valendo como pequenos prazeres que somados
representam um contentamento com a vida? Valem. Desde que nos lembremos que
eles são condicionados, temporários, limitados e impermanentes. E que eles não
custem a nossa saúde.
O comercial mais comovente da temporada é o de Natal da
Coca-cola gravado com crianças do interior do Piauí. Eu sei, eu sei, o
comercial é lindo e também partiu o meu coração. Mas, vamos pensar no que está
por trás dele.
O que é mesmo a Coca-Cola? Uma empresa centenária tão grande
que representa uma nação: são 700 mil funcionários (o equivalente à população
do Butão) em mais de 200 países, inclusive o Brasil que consome mais de 2
bilhões de litros por ano (cerca de 17 litros por pessoa)!
Coca-cola é isso aí: um líquido preto borbulhante sem nenhum
valor nutricional composto de água + ácidos que podem corroer o esmalte dos
dentes + corantes com alto potencial alergênico e cancerígeno + uma avalanche
de açúcar ou edulcorantes artificiais com potencial cancerígeno que deturpam o
paladar, descontrolam a glicemia, causam desbiose e obesidade + ácido fosfórico
que é nocivo para a saúde óssea + sódio que, em excesso, aumenta a pressão
arterial favorecendo a geração de doenças cardiovasculares + cafeína que, em
excesso, pode causar insônia, irritabilidade, dores de estômago, tremores
musculares e alterações na frequência cardíaca, embalado em garrafas ou latas
que poluem o planeta. Uma desgraça alimentar. Mas, e as novas versões com
teores reduzidos de açúcar? Uma desgraça com 30% menos de açúcar (ainda assim,
em torno de 24 g por lata, quase o equivalente a toda a ingestão diária
recomendada). Que níveis dessa coisa você acha que podem ser saudáveis? Se
abstrair as mensagens diretas, subliminares e delirantes do marketing e focar
na composição desse produto, sinceramente, você acha que ele pode ser oferecido
para as nossas crianças? E se não é adequado para as crianças, por que você, um
adulto inteligente e sagrado, consumiria algo que custa dinheiro (dedicamos
tempo da nossa vida preciosa em troca de dinheiro) e só oferece estímulos
adoecedores em troca de zero benefício nutricional?
Onde está a felicidade? Onde está a magia? A saúde? Onde está
a solidariedade e o cuidado? Nem vou perguntar sobre a coerência.
Meus amores, nada do que é comprável será capaz de suprir a
nossa necessidade de conexão, comunhão, cumplicidade, segurança, de sentido na
vida, liberdade, nem mesmo de prosperidade espiritual e muito menos felicidade.
Esse líquido preto pode vir embalado de verde, chamado de
life, magia ou felicidade. Não se iluda
com uma campanha apelativa que explora a imagem da vulnerabilidade de crianças,
distribui entretenimento para comover (isso é o melhor que a 4ª. marca mais
valiosa do planeta pode fazer pelas crianças do Piauí?) e disfarçar que o
objeto da sua ação é doença engarrafada com o rótulo de felicidade. Um delírio
publicitário que encantou muitos dos meus amigos nas redes sociais!
Para manter a saúde fique longe dessa coisa. Para ser feliz,
cultive uma vida saudável (física, emocional e espiritual) e tente fazer o bem
para os nossos companheiros de jornada ou, pelo menos, não faça o mal.
O meu desejo nesse Natal? Desejo que corporações tão
poderosas quanto nações, que pessoas públicas e políticos reconheçam o seu
potencial e dediquem todos os seus recursos a desenvolver produtos, serviços e publicidade
que realmente tragam algum benefício para a humanidade. Que eles prosperem muito
a partir do bem estar social. Porque, afinal, a humanidade somos nós, somos
todos um.
Feliz Natal.
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